terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Os Caminhos da Escola

texto de Deize Clotildes Barnabé de Morais*



Em Indaiatuba, como na maioria das pequenas vilas do Brasil, a escola pública, como local separado do lar onde as crianças são ensinadas por professores contratados pelo Estado, teve início em meados do século XIX. Os curtos espaços entre a residência e a escola eram percorridos a pé, em bandos. Não raro às meninas não se exigia que fossem à escola. Às mulheres era reservado um papel social que prescindia das letras e matemáticas.

Os filhos e filhas de famílias abastadas eram educados em colégios religiosos, onde a criança e o adolescente ficavam internados durante grande parte do ano, só vindo para casa nas férias. Percorriam corredores, capelas, escadarias e porões. Vez ou outra um mirante permitia que se lhe alargasse um pouco a vista, para além dos muros do internato.

Quando os primeiros imigrantes italianos e alemães chegaram a Indaiatuba, alguns poucos se instalaram na vila, os demais nas fazendas de café. A exceção foram os suíços, que se instalaram na “colônia” Helvetia, em terras próprias, com escola mantida às suas próprias expensas.

Os que fixaram residência na vila, dedicavam-se a trabalhos de poceiro, construção civil e um ou outro pequeno comércio.

Eram as últimas décadas do Século XIX.

A absoluta maioria instalou-se nas fazendas de café, literalmente substituindo a mão de obra escrava. O próprio regime de trabalho não se diferenciava em quase nada da escravidão: não tinham contrato, paga ou regalia. Era comum a figura do feitor a dirigir os trabalhos, com o chicote como ferramenta de persuasão. Contam os antigos que algumas fazendas tinham ainda escravos, a quem não se contara que estavam libertos!

As casas das colônias, geralmente feitas de pedra ou “barrote”, eram o mais simples que se possa imaginar: ao rés do chão, portas e janelas de madeira rústica, chão de terra batida, paredes internas que não chegavam ao teto de telhas vãs (a meia-parede), fogão a lenha.

Havia, porém um diferencial importante. Muitas famílias de imigrantes trouxeram consigo um professor, o “maestro”. Ele também um imigrante, morando nas mesmas condições e trabalhando, durante grande parte do dia, na própria lavoura. As crianças freqüentavam a casa do “maestro”, que servia de escola. O caminho era curto. A influência do mestre bastante longa. Ele tinha total controle sobre as crianças. Com a absoluta e irrestrita confiança dos pais. Os castigos corporais, freqüentes, faziam parte daquela pedagogia íntima e familiar. Nada, porém, abalava a ascendência moral e intelectual do “maestro”.

Com o passar dos anos, as famílias foram se organizando melhor, as condições do trabalho se modernizando, dando margem a que os trabalhadores fossem remunerados e também pudessem vender seu trabalho nos dias de folga, como carroceiros, pedreiros, poceiros, etc.

Até mesmo, algum pedaço de terra das fazendas foi cedido a eles, para que cuidassem de lavoura “a meia”, ou por conta própria. Com essas “regalias”, muitas famílias puderam ter seu próprio dinheiro e por volta do final do século XIX e começo do XX, era comum que comprassem sítios, pequenas fazendas e veículos próprios. Mesmo deixando a situação de colonos, mantinham relações estreitas com o maestro, já bem idoso então. As crianças caminhavam às vezes longas distâncias até sua casa para ter algumas aulas com ele. Eram alfabetizadas em italiano ou alemão, embora falassem português no dia a dia.

Os últimos filhos e os netos desses imigrantes já nasceram nessas terras próprias, integrados à comunidade, sem a presença do maestro e freqüentando as escolas da vila de Indaiatuba, de Mato Dentro ou Itaici. O caminho era longo e percorrido a pé, em bandos. A estrada era freqüëntemente deserta e poeirenta. Os mais velhos cuidavam dos mais novos. A escola era geralmente formada de uma única classe, onde a professora ministrava aulas até à terceira série, ao mesmo tempo para todas as turmas. A quarta série era ministrada somente na vila. Era freqüente que as meninas, por não serem admitidas no trabalho da roça muito novas, freqüentassem a escola por mais alguns anos, mesmo tendo concluído a terceira série. Aprendiam a bordar, fazer crochê e tricô e ajudavam a professora no trabalho com os mais novos, apagando a lousa, escrevendo textos a serem copiados e corrigindo os cadernos. Limpavam a classe e buscavam água no poço. Sobretudo acompanhavam os irmãos menores pela estrada, para evitar que fossem maltratados pelos maiores! Alguns, poucos, filhos de famílias mais abastadas, se aventuravam a pegar o trem e ir a Itu fazer o preparatório e depois o ginásio. O dia todo, desde a madrugada, era gasto nesse mister. Eram já considerados adultos, mesmo que tivessem doze ou treze anos. Vestiam ternos impecáveis de linho, que, muitas vezes chegavam queimados com as faíscas da máquina a vapor dos trens. Eram então cuidadosamente cerzidos a mão, para durar até que o rapaz crescesse! Às meninas não se permitia fazer esse percurso de trem, sozinhas. As que pudessem ou quisessem muito continuar os estudos, deveriam ficar internas em colégios de freiras. Aquelas cujas famílias não tinham alto poder aquisitivo, freqüentemente eram admitidas como bolsistas, fazendo no colégio, trabalhos os mais diversos para pagar seus estudos. Era uma vida dura e sem nenhum tipo de regalia.

Com a urbanização do município, as famílias foram se mudando para a cidade e suas vidas adquirindo o ritmo e os costumes do centro urbano. Mesmo assim, como só havia um grupo escolar, os caminhos eram longos. As ruas de terra e empoeiradas eram percorridas a pé ou de bicicleta. Das janelas ou portões, as mães e vizinhas vigiavam a passagem da criançada. Não fossem elas apanhar alguma rosa ou outra flor para levar para a professora! Ou, pecado dos pecados, tirarem algum naco do pão ou um gole do leite colocados na janela pelo padeiro e leiteiro e inadvertidamente ainda não retirados por algum morador “preguiçoso” que se levantasse mais tarde! Era a forma de a comunidade controlar a infância pelos caminhos da urbe!

As crianças que morassem nos bairros afastados por onde passava o trem, Itaici, Helvetia, Pimenta e Cardeal, usavam esse meio de transporte para vir a Indaiatuba fazer a quarta série ou, posteriormente, o curso ginasial. O trem era uma aventura diária. Os horários eram poucos e nem sempre cumpridos pontualmente. Chegavam à estação e ainda tinham que percorrer as ruas até à escola, agora já com os colegas da cidade que os esperavam. Muitos namoros começaram e terminaram no trem. Outros viraram casamentos duradouros.

Só em 1950 foi criado o curso ginasial no município. Instalado junto ao grupo escolar, os caminhos eram os mesmos. Quem quisesse continuar os estudos no nível médio ainda tinha que ir a Itu ou Campinas. Agora, de ônibus, embora as estradas ainda fossem de terra.

Para Itu ia grande parte dos estudantes: as mulheres em sua maioria fazer o “Normal” e os homens o “Científico” ou “Clássico”, que eram as denominações para os cursos médios da época. O curso Normal formava Professores Primários, o Científico era destinado aos adolescentes que quisessem fazer um curso superior na área de ciências exatas e biológicas e o Clássico para quem quisesse cursar o nível superior na área de letras ou ciências humanas. O Normal era pela manhã e os demais à tarde. Havia um ônibus, adquirido pela Prefeitura, muito velho e pintado de amarelo, que levava os estudantes para Itu. Era o famoso “Amarelinho”, que deixou de circular por volta de 1963, de irrecuperável que estava! A maioria das vezes parava no caminho, o motorista descia e como mecânico especialista (de ônibus amarelinho, evidentemente!), fazia-o funcionar de qualquer forma, mesmo que fosse aos empurrões!

- Agora... Vamos... Aí... Aí... Depressa, subam, senão morre outra vez...

E lá iam todos, em meio à poeira e buracos, mais uma vez chegando atrasados na aula! Com a roupa cheia de poeira e os cabelos... Ah, os cabelos! O ônibus era famoso em Itu. Passava pelas ruas centrais fazendo muito barulho e soltando fumaça. As moças do Normal, “lindas”, como diziam os rapazes, com a cabeça para fora, vendo e sendo vistas. Era uma festa. Às vezes mal interpretada pelas senhoras ituanas que, às janelas, torciam o nariz para “aquelas ali”!

Com o fim do amarelinho, as famílias tiveram que arcar com o transporte intermunicipal para Itu, nos ônibus de carreira. Havia somente três horários para lá: de manhãzinha, no meio do dia e ao anoitecer. Nesse período, com a dificuldade dos horários, recursos financeiros parcos e principalmente o desejo adolescente de aventurar-se e quebrar regras, desenvolveu-se um método muito econômico, no entendimento dos alunos evidentemente, de voltar da escola: pedir “carona”. O próprio termo pode ter se originado aí. Era necessário ter-se uma “cara bem grande” para fazer uso desse transporte! As meninas e meninos desciam em bando, do Colégio para a beira da ponte que separava o centro urbano de Itu da estrada para Salto, caminho único para Indaiatuba. Era necessário que se apressassem, para não correr o risco de, ao não conseguir a carona, perderem também o ônibus regular, o que seria uma catástrofe! Imaginem moças de boa família chegando à casa ao entardecer, quando seu horário habitual era, no máximo, às 14 horas! Os “caronistas” tinham regras e técnicas infalíveis de conseguir o transporte: as meninas ficavam à beira da estrada, levantando o braço para os carros que passassem (qualquer um servia, desde que viesse para Indaiatuba, por causa do horário), os rapazes ficavam escondidos embaixo da ponte, para não serem vistos da estrada e assim enganarem os motoristas que porventura quisessem dar carona só para as meninas. Ao parar o carro, imediatamente os rapazes pulavam na estrada e subiam primeiro, reservando os lugares, atrás, para as meninas. Era a forma de protegê-las do possível assédio. Algumas vezes o motorista, irritado com o estratagema, acelerava o carro e deixava a todos a ver navios...

As regras eram rígidas: não se pegava carona sozinho, nem quando no carro houvesse mais de um homem. As meninas que tinham namorado também estavam impedidas de usar esse meio de transporte. Quando, porventura, o ônibus passasse antes de a turma haver conseguido a carona, todos subiam, afogueados e “com o rabo entre as pernas”, sob as vaias dos que não admitiam essas “sem-vergonhices”. Outros tempos...

Com o passar do tempo, as estradas foram sendo asfaltadas, o transporte freqüente, os cursos foram se instalando em Indaiatuba, que foi, cada vez mais, incorporando-se à metrópole. Hoje o acesso a Campinas e Itu pouco se diferencia do acesso aos bairros da própria cidade.

Os estudantes têm transporte garantido, seguro, mas possivelmente, menos interessante. As dificuldades são outras...



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* Originalmente publicando no livro "Um Olhar sobre Indaiatuba" (1), da Fundação Pró-Memória de Indaiatuba

domingo, 17 de janeiro de 2010

Dia do Historiador: 19 de agosto

A partir deste ano os historiadores  poderão comemorar no dia 19 de agosto sua tão digna profissão.
O dia 19 foi escolhido em homenagem ao dia do nascimento de Joaquim Nabuco – 19/08/1849.


LEI Nº 12.130, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2009.

Institui o Dia Nacional do Historiador, a ser celebrado anualmente no dia 19 de agosto.

O VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no exercício do cargo de PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o É instituído o Dia Nacional do Historiador, a ser celebrado anualmente no dia 19 de agosto.

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 17 de dezembro de 2009
188o da Independência e
121o da República.

JOSÉ ALENCAR GOMES DA SILVA

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

2010: Paróquia Nossa Senhora da Candelária fará 180 anos

fragmento do texto de Marcos Kimura
publicado originalmente no Jornal Tribuna de Indaiá de 12/01/2010

[...]

Este ano [será comemorado] os 180 anos da criação da Paróquia, simultaneamente à da fundação da Freguesia de Indaiatuba, data adotada pelo Município para comemorar seu aniversário.

A origem da cidade está intimamente ligada a do que inicialmente foi uma capela. A origem lendária diz respeito a um certo José da Costa, que nos fins do século XVIII ao procurar uma vaca perdida acabou encontrando uma imagem de Nossa Senhora da Candelária em um riacho e, a partir desse acontecimento, teria decidido erguer ali uma capela dedicada à santa.  [Já a origem documentada, comprovada por registros] [...] indicam que em 1813 o tenente Pedro Gonçalves Meira solicitou a instalação de uma capela chamada Nossa Senhora da Conceição dos Cocaes, para cujo sustento ele doava algumas propriedades suas. [...] Após a morte de Meira, seu irmão e herdeiro, Joaquim Gonçalves Bicudo, passou a dedicar a capela a Nossa Senhora da Candelária.

Ainda segundo Carvalho, em sua Cronologia Indaiatubana, há registro que em 1819 a Capella do Santíssimo Coração de Maria Santíssima já era curada, ou seja, tinha caráter permanente e nela eram realizadas celebrações regulares, com um capelão designado pelo bispo. A existência de uma capela curada era condição primordial para a instalação de uma freguesia, o que de fato aconteceu em 1830 com Indaiatuba, Cabreúva, Rio Claro, Tatuí, Itatiba, Silveiras e Hyporanga, por meio de decreto imperial que atendia a uma resolução do Conselho Geral da Província de São Paulo. Lembrando que até a Proclamação da República não havia separação entre Estado e Igreja. O primeiro vigário era o padre Ignácio Francisco de Moraes.

Em 1838, a Câmara de Itu aprovou lei proibindo o “enterramento de corpos dentro dos recintos dos templos”. Na época, pessoas importantes eram sepultadas dentro das igrejas e os demais nos pátios em frente. Assim, no ano seguinte, o bispo dom Manoel Joaquim Gonçalves concede ao vigário da Igreja da Freguesia de Indaiatuba a permissão para benzer um cemitério, o de São Benedito, construído 220 metros ao norte [?] da Matriz.

Em 1855 é instalada em Itu a Sexta Câmara Eclesiástica, abrangendo as paróquias de Cabreúva, Capivari, Capivari de Cima (Monte Mor), Indaiatuba, Porto Feliz, Pirapora, Araçariguama e Santa Bárbara. Quatro anos depois, as freguesias de Cabreúva e Indaiatuba são elevadas a categoria de vila pelo mesmo decreto.

Em 1914, já em pleno século XX, foi criada a Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, em Helvetia, e encomendada a construção da Casa Paroquial da Candelária. Em 1915, foram construídas as torres da Igreja Matriz, às expensas de João Bueno de Camargo, um indaiatubano muito rico e que passava uns dias em sua terra natal, a quem o padre da época solicitou uma ajuda nas melhorias do prédio.

Em 1919, o padre Eduardo Pais Moreira “mandou fazer uma grande reforma na capela-mor, tirando todo o assoalho e degraus de tábuas velhas, trocando-os por degraus de mármore de carrara e por mosaicos de diversas cores feitos em São Paulo”.

Uma reunião realizada em 2 de julho de 1923, na sala nobre da matriz, designou uma comissão para tratar da reforma externa da matriz. Em 1929, Jesuíno da Fonseca Leite faleceu em São Paulo e deixou sete contos de réis para serem aplicados em reformas e consertos da Igreja Matriz de Indaiatuba.

Em 1967, chega à cidade o padre Hermínio Bernasconi, nomeado vigário da Paróquia de Nossa Senhora de Indaiatuba, onde ficou até 1970. Durante sua estada, realizou diversas reformas radicais na igreja – inspiradas no Concílio Vaticano II, do Papa João XXIII - despojando-as de seus altares laterais e removendo do altar-mor o famoso trabalho em madeira executado pelo escultor Monsieur Bernard. Antonio da Cunha Penna se recorda que muitos santos foram “despejados” do templo, sendo que até há pouco tempo ele ainda abrigava alguns deles em sua casa. Ainda em 1967, foi criada a Paróquia Santa Terezinha, em Itaici.

Em 1990, a Tribuna de Indaiá informava que o leilão da Festa da Padroeira daquele ano havia rendido 100 mil cruzeiros que, junto com o lucro da quermesse, seriam usados na reforma da Matriz, que envolvia pintura externa e troca de telhas e do forro.

O prédio da Igreja de Nossa Senhora da Candelária é um dos últimos existentes construído em taipa-de-pilão [veja aqui o que é taipa-de-pilão]. Este era o sistema construtivo dominante no planalto paulista até fins do século XIX e consistia em socar camadas de terra úmida entre formas de madeira (os taipas).

Nada se sabe com precisão sobre o início da sua construção, mas é com certeza que em 1839 já apresentava as paredes de taipa-de-pilão. Diversas alterações importantes aconteceram na Matriz em seus quase 200 anos de existência. Nada restou dos seus três retábulos artísticos, altares antigos, arco-cruzeiro, assoalho de tábuas nem do seu forro pintado, cujo único registro é uma foto colorida desfocada.


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Nota: A imagem deste post foi capturada no site da Matriz Nossa Senhora da Candelária

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O povoamento da região de Indaiatuba em tempos remotos: perguntas e pistas

texto de Adriana Carvalho Koyama


Imagina-se que grupos Tupi-Guarani tenham ocupado nossa região em tempos remotos, especialmente por descobertas feitas em locais próximos a Indaiatuba, como Monte Mor e Salto. O texto* seguinte traz uma das poucas pistas que temos sobre a população local em períodos anteriores à colonização portuguesa da nossa região.


Ponta de Flecha, 5000 AP.

Povos de cultura Tupi-Guarani

O antropólogo Professor Desidério Aytai da Universidade Católica de Campinas e a Doutora Nobue Myazaki (1974), pesquisadora do Instituto de Pré-história da USP, em escavações realizadas em 1972 no sítio arqueológico denominado Tapajós, com mais de um quilômetro de comprimento, situado do lado esquerdo do rio Capivari-Mirim, região próxima de Indaiatuba, encontraram numerosos cacos de cerâmica, urnas e outros objetos com características tupi-guarani com idade de 800 anos determinada pelo método da termoluminescência.

O engenheiro José Luiz Bicudo do Valle, colecionador de antiguidades e conservacionista, cujos ancestrais se fixaram em Indaiatuba há mais de 200 anos, possui um machado de pedra polida de origem indígena, encontrado nos campos da fazenda Pau Preto, hoje área urbana de Indaiatuba 1.(CARVALHO: 2003)



Urna funerária de tradição Guarani, 800 AP, encontrada em Monte Mor


De fato, grupos Guarani habitam São Paulo há muito tempo, talvez 2000 anos. E antes dos Guarani outros povos passaram por aqui. No sítio arqueológico “Alice Böer”, na região de Rio Claro, foram encontrados vestígios de ocupações com 14.000 anos, aparentemente.

Os Guarani cultivam palmeiras, batata-doce, abóbora, vários tipos de milho, mandioca, amendoim e feijão. Plantam roças em áreas próximas às habitações e, antes da colonização portuguesa, também plantavam árvores e arbustos às margens das estradas que mantinham para seu deslocamento periódico. Segundo informação do Governo de São Paulo,

A história de São Paulo tem seus primórdios calcados nas trilhas dos índios [...]. A interiorização remonta ao Caminho do Peabiru, importante rota dos indígenas sul-americanos, ligando
 São Vicente – SP ao Peru. Essa trilha passava pelo Vale do Anhangabaú, em São Paulo,
e seguia em direção a Sorocaba e aos rios Paranapanema, Ivinhema e Corrientes,
onde o caminho passa a ser fluvial, chegando ao rio Paraguai e cruzando o território guarani. Daí, incorporava-se às rotas dos Incas, atingindo o Peru.2


As estradas mantidas pelos Guarani ficavam plenas de alimentos, plantas medicinais e árvores frutíferas. Esses alimentos atraíam animais pequenos e grandes, como antas, veados, catetos e capivaras, que eram caçados com diversas técnicas: armadilhas engenhosas, lanças, etc. Entre as frutas estão o abacaxi, o caju, abacate, mamão, maracujá, jabuticaba, pitanga e goiaba. O araticum, antes abundante em Indaiatuba, também fazia parte dos pomares indígenas.

Entre as árvores cultivadas pelos povos indígenas as palmeiras se destacam em todo o país: suas folhas servem para a cobertura das casas, para fazer cestos, esteiras e tecidos, os frutos servem para alimentação ou para fazer óleos comestíveis, para iluminação ou para repelir insetos, e finalmente, a madeira serve para inúmeros fins. O nosso Indaiá tem uso conhecido para a cobertura de casas.




Indaiá
Imagens da Coleção Antonio da Cunha Penna
Acervo FPMI

Até recentemente acreditava-se que aos povos indígenas faltasse conhecimento para a exploração intensiva do solo, que levaria a uma produção suficiente para o estabelecimento de comércio, para a criação da vida urbana e para o enriquecimento da sociedade. As pesquisas têm mostrado que essa visão tem muito de preconceito e pouco ou nada de compreensão do conhecimento indígena, e ultimamente os antropólogos têm ressaltado que o manejo das matas e demais recursos naturais pelos povos indígenas é sofisticado e cria uma economia auto-sustentável, garantindo a sobrevivência de várias gerações consecutivas.

Quebra-coquinho guarani


Hoje sabemos que existe uma opção desses povos em relação à riqueza, no sentido de não acumularem bens e de trabalharem apenas parte do dia para sobreviver, dedicando-se a outros afazeres no seu “tempo livre”. Nos tempos em que suas terras ainda não haviam sido invadidas, quando as plantações davam excedentes, era comum fazerem festas que duravam semanas ou até meses, para que esses bens fossem consumidos, e não comercializados ou acumulados, gerando riqueza e disputas por sua propriedade.3

Outra afirmação preconceituosa sobre sociedades indígenas é que os índios não teriam organização política e leis. Estudos recentes apontam para o fato de que sua organização política baseia-se em um delicado equilíbrio para manter uma relação de igualdade entre a chefia política e a sociedade. Segundo Pierre Clastres, entre os Guarani o chefe político não tem poder, mas sim autoridade intelectual e moral:


...o chefe não possui nenhum poder de coerção, nenhum meio de dar uma ordem. (...). Essencialmente encarregado de resolver os conflitos que podem surgir entre os indivíduos, famílias, linhagens, etc., ele só dispõe, para restabelecer a ordem e a concórdia, do prestígio que lhe reconhece a sociedade. [Ele deve] tentar persuadir as pessoas da necessidade de se apaziguar, de renunciar às injúrias, de imitar os ancestrais que sempre viveram no bom entendimento. (...) Se o esforço de persuasão fracassa, então o conflito pode muito bem se resolver pela violência e o prestígio do chefe pode muito bem não sobreviver a isso, uma vez que ele deu provas
de sua impotência em realizar o que se espera dele.4

Podemos imaginar grupos pertencentes a essa sociedade povoando os campos de Indaiatuba desde oitocentos anos atrás? Essa imagem parece contradizer a visão de “atraso” que normalmente acompanha nossas suposições sobre as sociedades indígenas. Essas descobertas foram possíveis depois que aprendemos a estudar sociedades diferentes da nossa a partir de uma visão não etnocêntrica, ou seja, numa tentativa de conhecer o outro, o diferente de nós, com os olhos do outro, a partir dos valores da cultura estudada, e não a partir dos valores culturais da nossa própria sociedade.

É possível também exercitar essa forma de olhar “antropológica” para compreender as diferenças culturais internas da nossa sociedade, e contribuir para uma convivência pluralista e para o respeito aos “outros”, aos que têm valores, conhecimentos, religiões, formas de vida e de organização familiar diferentes dos nossos. Em uma cidade formada por migrantes e imigrantes de regiões e países tão diversos, como é Indaiatuba, essa é uma grande aprendizagem. Para olhar para o passado e também para o presente.


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1- CARVALHO, Nilson Cardoso de Cronologia Indaiatubana. Indaiatuba: mimeo, 2003.
2- http://www.transportes.sp.gov.br/historiatransportes.htm
3- CLASTRES, Pierre. A Sociedade contra o Estado. RJ: Francisco Alves, 1982
4- CLASTRES, Pierre. A Sociedade contra o Estado. RJ: Francisco Alves, 1982.


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* Texto originalmente publicado no livro "Um Olhar Sobre Indaiatuba" - 2006

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

CONTO: Vida e Obra de José da Costa

conto* escrito por Douglas Valeriano Pompeu
para o prêmio literário "Acrísio de Camargo" de 2009



Ninguém o viu atravessar a noite anônima. Se ele vestia mesmo a velha batina ou se, ao apontar na margem, exibia ainda o rosto pálido e úmido que lhe ofereciam os delírios. Mas em poucos dias ninguém mais ignorava a incompreensível morte do homem devoto, descoberta em silêncio e por fim enterrada no braço mais longo do rio. O certo é que no dia seguinte à madrugada em que José da Costa sumiu de vez destas terras, algum tropeiro recém-chegado caminhou até o curso d’água mais próximo, ajoelhou-se no lodo para matar a sede ou lavar o rosto e encontrar o já esquecido terço que lhe pertencia. O que se passou adiante foi uma sucessão de fatos ainda incríveis que reforçaram o estatuto mítico deste episódio e que, portanto, até hoje o mantém relacionado com um dos princípios de fundação desta cidade.

Da vida de José da Costa cuidaram primeiro as mulheres dos tropeiros estabelecidos nos arredores de sua morte. O que narraram é que dias antes a capela esteve trancada e José da Costa desaparecido. Passada uma longa estiagem e a praga que lhe dizimara tenros novilhos, ele subitamente voltara. Nos seus últimos dias, indo e vindo sobre o descampado entre a capela e o seu rebanho, punha-se a falar sem interrupção e numa dicção contaminada, enquanto aos poucos ia se reconhecendo sua figura enfiada nos farrapos da batina. Daí dizerem que já não era mais o mesmo, pois vestia agora a batina todos os dias, não respeitando mais os limites éticos da enfermidade. Outros diziam ainda que ele começara a fazer contas, a contar repetidamente o número de novilhos de seu pastoreio, usando para isso uma caderneta que se não a estivesse empunhando, ocultava-se à altura da cintura numa costura secreta da batina. Neste ponto, a história se confunde ou se perde. O que nos chegou aos ouvidos deriva somente do cantar tropeiro e pastoril, responsável pela imagem de um cuidadoso pastor que não se via de Goiás ao Paraná, devoto de Nossa Senhora Candelária, a quem erigiu uma capela na foz do Votura, e que em seus últimos dias teve o juízo irremediavelmente perdido.

Segundo se sabe, essa primeira e mais reconhecida obra foi realizada após uma tempestade e foi fruto da evasão de um novilho e da insuspeitada aparição da Virgem. A batina viera algumas semanas depois de terminada a capela e de sua construção explica-se a deformidade que exibia nas mãos. Porém os maus-tratos do corpo e o delírio sacrílego parecem nunca ter maculado sua índole de bom pastor e sua sincera devoção. Até mesmo havia condescendência por parte dos que participavam no sacerdócio, que vez ou outra ele arremedava, ali mesmo, no abrigo da santa imagem que lhe indicara o novilho perdido. Aqueles que o seguiam nestes dias, o seguiam calados e obedientes, como se a mínima obstrução na fluidez de seu delírio, pudesse romper lhe por dentro aquilo que sempre, no dia seguinte, o devolvia calmo ao seu rebanho.

Já sua segunda e talvez última obra, subterrânea, heróica, porém fragmentada, atribuída e até agora ignorada, sendo de origem e natureza imprecisa, portanto, de pouco valor biográfico ou histórico, é notadamente o primeiro documento literário significativo destas terras. A julgar pelas notas que acompanham o manuscrito, trata-se de uma écloga ou um pequeno poema pastoral em decassílabos que explicaria o episódio da fuga do novilho e, finalmente, seu encontro pessoal com a santa. Dele nos sobraram apenas sete versos que figuram exemplarmente ao lado de grandes poemas árcades em língua portuguesa, levando a vantagem de estarem marcados por uma extração ainda mais oral do que os poemas de nossos ilustres neoclássicos.

Sua procedência é mais curiosa do que fictícia. Faz parte do espólio do célebre monsenhor José Camargo de Barros, mais precisamente, do que se encontrava com ele na tarde de seu trágico desaparecimento, a bordo do transatlântico Sírio, em 4 de agosto de 1906, em Bajo de Fueras, próximo ao Cabo de Palos, no litoral da Espanha. O manuscrito encontra-se em péssimo estado e só foi recuperado, pois, juntamente com dois outros documentos, estava entre as páginas de uma edição italiana de Virgílio que caindo nas mãos do marquês de Cavalcanti, foi entregue à biblioteca do Mosteiro de São Bento, na capital.

O caminho obscuro traçado pelo manuscrito até o espólio de Dom José é, sem dúvida, repleto de hiatos. A começar pela morte do bispo. Pois, como se sabe, José Piconne, capitão então com mais de quarenta anos de experiência na travessia do Atlântico pela linha de Gênova, mas que, segundo testemunham, tinha a aparência suja de um pirata vestido pela marinha, dormia no instante em que o grande impacto levou a embarcação a pique. Tendo ouvido o estrondo e reconhecido rapidamente o naufrágio, foi um dos primeiros a se lançar no mar, abandonando tripulação e passageiros e sendo levado a salvo para a prisão em Cartagena. Uma bela imagem do momento do incidente pode ser vista na tela do pintor Benedito Calixto, terminada um ano após o naufrágio. Nela, figuram em primeiro plano Dom José acompanhado de outros três prelados em oração, enquanto ao fundo homens e mulheres correm afoitos e abandonam o navio. As feições e a calma aparente de Dom José destoam claramente da vertigem e do clamor embutido inclusive no rosto dos seus companheiros. José de Camargo está ereto e mira o horizonte, enquanto a sua volta, um deles empunha um salva-vidas e os outros dois, ajoelhados, ou olham clementes o bispo, ou abandonam-se completamente em profunda oração. Destoa também das feições serenas do bispo o suposto tripulante que, segundo se diz, lhe havia tirado o salva-vidas e facilitado a sua morte curiosamente no momento da benção dos aflitos que se lançavam no mar. Assim como, na pintura de Calixto, não deixa de encerrar algum mistério o livro de bruços no convés, ao lado deles, a ponto de ser destruído pelas vagas que invadem o navio.

Quem tenha lido com atenção os relatos sobre o naufrágio e considera a explosão das caldeiras e os 200 corpos desaparecidos, que logo desanimaram outras buscas pelos pertences a bordo, entende que mesmo a materialidade do poema é suspeita de adulteração. Se, por um lado, não resta dúvida de que a descoberta do manuscrito teria a mesma data da chegada do corpo do bispo no porto de Santos, por outro, há quem diga que sua autoria seja duvidosa. No entanto, o reconhecido talento de Dom José como orador sacro e grande autor de homilias, a despeito de sua pouca ou nenhuma vocação para a poesia clássica e secular, colocam em xeque a possibilidade de o bispo ter uma vida noturna ou uma obra invisível, mesmo sendo ele admirador da poesia latina. Já o marquês de Cavalcanti, quem acompanhou o corpo do bispo até o Brasil, era conhecido somente pelo único e limitado talento de saber se emprumar em nobres uniformes. Nem mesmo as notas anônimas nas margens do manuscrito são de grande importância, pois trata somente de confirmar a irregularidade dos decassílabos e a frouxidão de sua sintaxe. Em todo caso, a descoberta, no verso do manuscrito, de um comentário escrito a lápis e quase todo rasurado, mas que ainda nos deixa ler com certo espanto uma ou outra palavra, a que tudo indica, forjada pelo próprio bispo, é até agora a única pista para a atribuição da autoria destes versos:

[...] ainda que de execução mais ou menos torpe, sem dúvida esta peça remonta aos princípios de fundação do antigo arraial de Cocaes e não poderia se tratar de outro pastor senão daquele que foi abençoado por N. S. Candelária que concedeu-lhe o hábito de pastorear palavras [...]

Para o leitor desavisado, é possível dizer que o documento está quase todo perdido. Não se consegue recuperar o que estaria por baixo das rasuras e das manchas deixadas pelas águas, pelo tempo e pelas condições em que este frágil manuscrito viajou até o presente. Nem mesmo é possível averiguar se as referências feitas por Dom José são de algum valor, apesar do tom categórico do provável primeiro leitor desta écloga, pois sequer o nome de José da Costa é mencionado. A ação das vagas sobre o manuscrito deram-lhe tanto o estatuto de objeto diáfano que, hoje, todo ele, o poema, o comentário e as notas na margem valem mais pela aparência de um palimpsesto exótico, do que pelo seu valor de verdade.

A isto se soma a falta de pesquisa concreta sobre a vida e as obras de José da Costa. A infinita dificuldade em comprovar a autoria do poema e, além disso, entender o percurso deste manuscrito através de quatro séculos, nos levaria a dizer até mesmo que o devoto e o bispo são a mesma pessoa. Em tempos imemoriais, José da Costa se aniquila nas águas que banharam o nascimento desta cidade e séculos depois é encontrado na costa da Espanha, irreconhecível e de batina. É logo enviado para o Brasil num ataúde hermeticamente fechado, sendo recebido como Dom José pela alta camada social de Santos, o alto clero e a massa popular. Desse modo, o poema nunca saíra da costura secreta de sua túnica, estaria registrado na mesma caderneta que José da Costa empunhou em seus últimos dias e que acabou arruinada pelo sal e pelas vagas. Se a natureza desta hipótese parece imprópria, através de delicadas dobras no tempo ela nos traz o poema, seja ele escrito agora ou nas margens do Votura, saudando a máxima de que o mar devolve os seus barcos, mas não sofre coisa morta:

[...]
após c’o cetro recolher rebanhos,
dos céus cautela e frio a tarde toma,
a grei me cerca, nem de mim se peja,
de pé me ponho em direção às águas
e enxergo a Virgem, que me avista e logo
os sinos, se há vagar, se dobram surdos:
longe dos ventos dorme sobre os campos

[...]
1 Rascunhos de duas ou três homilias e um modelo de carta decreto para canonização.


.....oooooOooooo.....
 
 

Cerca de um ano após a morte de Dom José,  Benedito Calixto produziu em 1907 este óleo sobre tela, com 160 x 222 cm, denominado Naufrágio do Sírio, e que é preservado no acervo do Museu de Arte Sacra de São Paulo, na capital paulista.




 
O conteúdo deste post é uma ficção onde dois "personagens" de nossa História são referenciados: Dom José de Camargo Barros e José da Costa.

Segundo relatos orais, José da Costa foi o fundador de Indaiatuba. Esse "relato oral" carece ainda de fontes documentadas, sendo que alguns historiadores chegam a afirmar que é um mito.


quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

O Fantástico Fantasma da Ituana

texto escrito por José Júlio Finatti em 2006



No início dos anos 70 o Primavera disputava a Liga Amadora local quando uma ala jovem e dissidente da diretoria que se encontrava no poder, resolveu se unir e concorrer à eleição para composição do Conselho Deliberativo, onde a maioria tinha ideias retrógradas e se arrepiavam só de ouvir falar em voltar aos campeonatos profissionais da terceira divisão da Federação Paulista de Profissionais.

Havíamos recebido o convite da própria federação e lançamo-nos à luta. Paulatinamente fomos renovando o Conselho injetando-lhe sangue novo, a tal ponto, que logo contávamos com a maioria no mesmo, com direito a decisões próprias e por incrível que pareça, a maioria deles uniram-se a nós, nessa empreitada, que a princípio parecia tão árdua.

Resolvemos concorrer as eleições, já com apoio total de toda a diretoria e fomos eleitos, com a total maioria dos votos.

Fomos eleitos, o Sr. José Éder de Oliveira como presidente e eu como vice-presidente. Formamos uma equipe idônea que foi de encontro às indústrias locais pedindo a sua ajuda, com o que pudessem contribuir, pois a despesa seria muito grande.

Esse patrocínio foi fundamental, pois pudemos adequar o nosso estádio construindo aquela arquibancada coberta, que existe até hoje com acomodação aos atletas que viessem de fora.

Resolvemos de comum acordo patrocinar um campeonato amador local, que nos rendeu muitos frutos, pois através dele montamos um time respeitável, não a ponto ainda de ganharmos o campeonato, mas já adquirindo experiência que seria fundamental para as disputas futuras.

No campeonato seguinte já com vistas voltadas a horizontes mais amplos, e com o apoio quase que total de todos, começamos a reforçar o time, com jogadores locais e de outros oriundos de outras cidades, principalmente da capital, e nesse mister, foi de fundamental importância a ajuda do Sr. Hélio Milani que possuía livre acesso à Federação, bem como alguns times da primeira divisão.

Esses atletas começaram a chegar com muita festa de toda torcida e diretoria, vamos citar alguns deles:

Alemão: zagueiro raçudo e sem medo de divididas.
Marcos Jacaré: ponta direita, de Santos.
Tonho: ponta esquerda da Várzea Paulistana.
Airton: centro-avante de São Paulo.
Ricardo Dourado: também paulistano.
Luquinha: “o rei da Vila Havaí” e muitos outros que chamariam a atenção dos torcedores locais, atraindo-os aos jogos - tanto locais - como fora de Indaiatuba.

Quando os jogos eram aqui, reuníamo-nos por volta das 9:00 às 10:00 em um grande contingente de torcedores e seguíamos em carros, caminhonetes e caminhões. Fazíamos uma carreata acompanhada de muito foguetório e com a tradicional charanga, acomodada em um ônibus, cortado ao meio como se fosse uma barcaça. Isso uma genial invenção dos irmãos Wolf, que chamava muito a atenção por onde passava, com Clovis Wolf na direção.

Outro expediente usado por nós para chamar mais torcedores aos jogos locais, era colocar na preliminar dois times locais e de rivalidade no nível de bairros. Isso sempre proporcionava um acréscimo à renda.

E assim com o entusiasmo aumentando dia a dia, fomos passando pelas diversas fases do campeonato e chegando as finais da 3ª divisão.

Nosso adversário seria A.E. Laranjalense, de Laranjal Paulista.

Aqui cabe uma pausa.

Essa mesma equipe, durante o transcorrer do campeonato, havia nos imposto uma derrota na sua cidade,  onde ocorreram cenas lamentáveis, com agressões a torcedores nossos, inclusive mulheres e crianças que ousaram acompanhar o time nessa ocasião, sem esperar tamanha selvageria.

O primeiro jogo das finais foi marcado para Indaiatuba.

Dias antes recebi um telefonema de um diretor da Laranjalense, que havia sido meu colega de colegial em Tietê, o Sr. Nivaldo Tumolo.

Indagou-me ele como se encontrava o ambiente em nossa cidade, com relação ao jogo.

Fui bem claro com ele, dizendo-lhe que os jogadores e diretores teriam toda a proteção de nossa parte, inclusive com escolta policial, porém quanto aos torcedores, se por acaso viessem, não poderíamos prometer o mesmo, pois seria difícil deter a torcida devido a revolta pelos fatos ocorridos em Laranjal.

E assim foi feito, eles vieram sem torcida alguma e perderam o primeiro jogo.

A disputa era melhor de 3 pontos e portando o próximo jogo seria na casa do adversário.

Durante a semana,que antecedia o 2° jogo, a cidade começou a se preparar.

Ônibus foram fretados e muitos outros cedidos pela Prefeitura, firmas e mesmo políticos que se preparavam para as eleições municipais.

Eu como possuía família em Tietê, que é vizinha a Laranjal, mais ou menos 30 minutos distante, fui pra lá no sábado.

No domingo após o almoço, eu e meus dois cunhados fomos para Laranjal.

Lá chegando, como faltava quase uma hora para o jogo, fomos até um bar no centro, que era o ponto de reunião da torcida local,  muito próximo ao estádio.

Comecei a prestar atenção à conversa dos presentes, e um deles parecia ser o mais fanático, dizia em altos brados que a torcida do Primavera não teria peito de ir até Laranjal.

Como que contrariando a sua teoria, ao longe começaram timidamente  estourar uns poucos rojões, mas que àquela distância não nos encorajava a prever o que aconteceria minutos depois.

Não se havia passado uns 10 minutos quando o fragor dos fogos foi aumentando e nisso  já ouvíamos alguns gritos mais próximos o já famoso slogan: “1, 2, 3, 4, 5 mil queremos que Laranjal vá...”.

Nisso chega um moleque de uns dez ou onze anos mais ou menos, com os olhos arregalados e um tanto assustado dizendo:

“_ Eles estão invadindo nossa cidade!”

Saímos à porta do bar e lá ao longe divisamos uma caravana enorme de veículos e principalmente ônibus, cujos ocupantes vinham com metade do corpo para fora, gritando impropérios e provocando a todos quanto iam encontrando pelo caminho.

Aquele mesmo torcedor que minutos antes tinha dito que a torcida do Primavera não teria peito de ir a Laranjal comentou: “É hoje nós vamos ter de calar a boca em nosso próprio campo, pois corremos o risco de apanhar aqui mesmo.”

E essa mesma torcida foi adentrando ao estádio local como uma nuvem de gafanhotos, ocupando todos os espaços disponíveis, deixando aos locais apenas algumas vagas em pontos piores do estádio.

E essa  torcida vibrante deu forças ao Primavera de ganhar lá mesmo, coisa que alguns dias antes nem mesmo o mais otimista dos torcedores acreditaria que ocorresse.

Que saudades eu sinto dessa época em que o Primavera era apoiado pela grande maioria da cidade, quando hoje é execrado, talvez por péssimas administrações que se seguiram e levaram o clube a descredibilidade quase total perante a população.

Fica a pergunta no ar: quem sabe os futuros políticos, alicerçados na convicção de que novas conquistas possam surgir que elevem o nome do clube e em conseqüência disso, de nossa cidade, voltem a apoiar o E.C. Primavera e ele saia da obscuridade e volte a fulgir no cenário desportivo, no lugar onde sempre mereceu - e de onde nunca deveria ter saído.

E se me orgulho de dizer que sou indaiatubano, mesmo aqui não tendo nascido, nesse dia, meu orgulho seria ainda maior, pois o clube e povo unidos teriam galgado mais um degrau em direção à glória.

Pensem bem indaiatubanos, e não percam a oportunidade de colaborar com essa empreitada grandiosa, porém não impossível, de vermos grandes clubes, adentrando o gramado do “Gigante da Vila Industrial”, trazendo de volta aquele orgulho, que fará unir as torcidas dos outros clubes locais, em torno de um objetivo único, ou seja: elevar o nome do clube, e da cidade. A conquista de resultados positivos pode aumentar em nós a vontade de darmos nossa colaboração, por pequena que seja, de fazer de Indaiatuba uma força maior, no cenário regional, pois em muitos setores mesmo que não seja do esporte, de há muito já ultrapassamos os limites possíveis e imagináveis.

E que Deus esteja conosco, iluminando-nos e indicando caminhos em direção àquilo que Indaiatuba merece.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Joaquim Emigdio de Campos Bicudo (2)

Joaquim Emigdio de Campos Bicudo, conforme já escreveu o pesquisador Nilson Cardoso de Carvalho,

" foi uma das figuras mais importantes da Vila de Indaiatuba na segunda metade do século XIX"... estando seu nome ... "presente a todas as atividades de interesse relevante para a comunidade da época. Foi coletor de rendas gerais e e provinciais, comerciante, fazendeiro cafeicultor e industrial em Indaiatuba."

Em 1875 casou-se com D. Escolástica Angelina da Fonseca, filha do abastado fazendeiro de Indaiatuba, Capitão José Manoel da Fonseca Leite, de quem o casal recebeu a fazenda Pau Preto como dote de casamento. O casal teve 8 filhos (Luiz Gonzaga de Campos Bicudo, Francisco de Campos Bicudo, José Francisco Bicudo, Joaquim da Fonseca Bicudo, Tereza Bicudo Almeida Prado,  Maria do Carmo Bicudo Ferraz, Ana Fonseca Bicudo e João da Fonseca Bicudo), todos eles na imagem abaixo, junto com a mãe:



 A imagem é de 1892, quando D. Escolástica já era viúva de Joaquim Emigdio,
que faleceu precocemente com 48 anos de idade. Na ocasião de seu falecimento,
seu filho mais velho tinha 15 anos e o mais novo 4 anos.


O segundo menino da esquerda para direita é Joaquim da Fonseca Bicudo, avô de Vera Regina Bicudo, que conta:

"Meu avô Joaquim da Fonseca Bicudo, conhecido como Quinzó Bicudo, era o sétimo filho de Joaquim Emigdio de Campos Bicudo. Nasceu em 1886. Tinha 5 anos quando perdeu o pai. Aos 9 anos foi aluno interno do Colégio Makenzie em São Paulo mas saiu aos 13 anos - após várias fugas onde pegava o trem e depois as chamadas "jardineiras" até chegar em Indaiatuba.

Aos 15 anos recebeu da sua mãe como parte de sua herança a Fazenda Paraizo em Itu, de propriedade ainda da família. Fazenda esta que havia sido do Barão do Itaim. E assim, sozinho, começou a sua vida de fazendeiro, permanecendo solteiro até 29 anos, quando resolveu casar.

Para arrumar uma pretendente,  promoveu um "pic-nic" na fazenda, convidando todas as famílias tradicionais da região que tinham filhas "casadoiras". Foi uma festa muito comentada e famosa na época, isso em fevereiro de 1915.  Nesse "pic-nic", como era chamado,  entre mais de 200 pessoas, escolheu a sua noiva.

Um mês após, foi à casa do sr.  José Balduíno do Amaral Gurgel em Itu, pedir a mão em casamento de sua filha Maria Adelaide Galvão do Amaral Gurgel, que então tinha acabado de completar seus 15 anos. Em maio do mesmo ano se casaram.

Tiveram apenas 1 filho, meu pai, Joaquim da Fonseca Bicudo Filho que nasceu em 1917.

Meu avô exerceu um papel importante, influente e de benemerência na vida social, cultural e política da cidade. Foi ativista na política do estado de São Paulo e de Itu, onde era o presidente do Diretório Democrático da região.  Um homem respeitado e muito reconhecido por todos.

Em dezembro de 1930 no começo da Revolução, por uma ação direta do Governo Federal no Estado e na cidade, o "Governo de Itu" como era chamado, foi destituído e Joaquim da Fonseca Bicudo foi indicado por esse Governo Federal como Interventor do Governo Civil de Itu. Fato este repercutido com honrarias pela escolha dele.

" Nada mais justo e digno de encomios do que a deliberação tomada pelos próceres da situação de entregar a chefia do Governo Civil nas mãos do benemérito presidente do Diretório Democrático."

Assim dizia um trecho da reportagem da "Folha de Ytu" no domingo, 14 de dezembro de 1930 /ano I / n-6.

Na década de 1940,  Quinzó Bicudo, tendo necessidade de material para construção e devido às dificuldades do transporte, pesquisou o barro que tinha na Fazenda e verificou que era matéria-prima compatível para fazer tijolos. Então fundou a primeira cerâmica em Itu, na própria Fazenda,onde fabricava tijolos e telhas. Cerâmica Paraizo. Foi o precursor dessa indústria em Itu e na região, que já nos anos 70 eram mais de cem.


Trabalhou muito a vida inteira e mesmo fora da vida politica na cidade, sempre ajudou à todos que necessitavam.

Foi membro benemérito do Asilo Nossa Senhora da Candelária onde sempre prestou auxílio aos idosos menos favorecidos.

Também ajudou financeiramente na construção de uma ala deste asilo, onde se encontra uma placa de bronze em sua homenagem.

Foi um ótimo pai e um avô maravilhoso de quem guardo muitas recordações, todas as histórias da família e quase todos os meus aprendizados. E um irmão presente, amigo, conciliador, adorado e tido como exemplo por todos eles.

Faleceu em 1986, aos 100 anos, lúcido, em sua casa em São Paulo

Deixou 3 netos e 7 bisnetos."


Imagem de Joaquim da Fonseca Bicudo, com 29 anos, em 1915.


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Imagens cedidas por VERA REGINA NOGUEIRA BICUDO, que também contou a história de seu avô, enriquecendo a biografia do indaiatubano Joaquim Emigdio de Campos Bicudo.


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